Mapa 1: Here be Dragons (2010)

Here be Dragons (Aqui há Dragões, do latim Hic Sunt Dracones) é uma frase da cartografia medieval usada para designar territórios desconhecidos ou perigosos, imitando uma prática medieval frequente de colocar serpentes marinhas e outras criaturas mitológicas em áreas em branco do mapa.

Na verdade, o único uso conhecido desta frase em mapas medievais é em latim, "HC SVNT DRACONES" (isto é: hic sunt dracones) no Globo de Lenox (1503-07) onde o termo aparece na costa leste da Ásia. Muitos outros mapas contém uma variedade de referências a criaturas mitológicas e criaturas reais, contudo o Globo de Lenox é o único em que esta frase está gravada.


– cf. Wikipedia.


Como se de uma cartografia sentimental se tratasse, Here be Dragons inicia o trabalho de mapeamento fotográfico em torno de lugares geograficamente importantes, ligados ao meu passado, não sendo relevantes as suas coordenadas geográficas.

Este primeiro mapa remete para um período bastante alargado da minha vida, desde a infância até ao final da adolescência. É um local envolvido por uma pequena cidade, que se assemelha a uma ilha repleta de rochedos, com vegetação densa e baixa, poucas árvores, uma charca e um antigo poço escondido entre a vegetação. Muitos animais – domésticos e selvagens –, insectos e répteis. Entro por trilhos recentes. Procuro trilhos antigos, quase apagados. Algumas pegadas. Algumas marcas deixadas por bicicletas. Tábuas, tijolos e pneus: rampas de salto. Uma revista abandonada, roubada de uma gaveta trancada. Um beijo: o primeiro. Ouve-se um tiro: um cowboy, dois cowboys. Um cão a seguir-me de longe. Atiro uma pedra. Arrependo-me. Continua a seguir-me. Não sei o nome dele mas queria ser o dono. Um bode fugido de uma quinta próxima: foge (regressa?). Uma rocha cinzenta, quente, com uma cobra pardacenta: uma espiral. Fujo. Só tínhamos moedas para o "mata-ratos". Foi um bom começo: nunca mais consegui fumar. Vou aprender a gostar de cerveja mais tarde - agora não. Não me lembro em qual das entradas deixei a bicicleta. Tenho as mãos geladas. Não as sinto. Está a ficar escuro. Estes sons: pelo eriçado. A caminho do pinoco, como se fossemos colocar uma bandeira. Ainda bem que vais à minha frente. Posso olhar melhor para ti sem te dares conta. Não ias gostar do que tenho para te dizer. Acabo por não dizer. Digo quando for grande, nem que seja para dentro de um destes buracos, para um ouvido destes rochedos. Eles ainda cá estarão. Sei que tu não. A charca secou. Devem estar mais de 40 graus aqui. Parece que foi ontem que ali escorreguei no gelo. Mais um rasgão nas calças. Já me sinto culpado à frente da mãe. "Não voltes a ir para ali, sabe-se lá quem lá anda". Uma fenda: uma pequena entrada vedada por uma teia. É quase hora de jantar. Não consigo regressar a casa, logo ali, na direcção daquele clarão laranja que está a desaparecer.

As rochas são as únicas testemunhas do que aconteceu e está por acontecer ali. Os trilhos unem e marcam todas essas histórias. Ao fundo, ali bem perto, a pequena cidade continua a espreitar e a querer entrar na terra dos dragões. Os dragões que ali procurei afinal não existiam, mas é um segredo que vai ficar bem guardado.